Pequenas ações que podem gerar grandes problemas

Como a falta de manutenção adequada dos usuários de edificações coletivas pode se tornar grandes problemas.

Fernando Tury

8/21/20253 min read

Pequenas ações que podem gerar grandes problemas

Nos edifícios coletivos, muitos moradores acreditam que suas ações individuais não interferem no sistema como um todo. Por desconhecimento ou por transferirem a responsabilidade ao síndico, acabam negligenciando cuidados básicos que, embora simples, são indispensáveis para preservar o desempenho e a vida útil das instalações. Essa falta de atenção pode gerar falhas precoces, custos elevados e riscos coletivos.

Os erros de uso são frequentes. Ralos sem limpeza podem provocar entupimentos e infiltrações nas unidades inferiores. O descarte de óleos e gorduras nas tubulações cria depósitos internos que reduzem a capacidade de escoamento e causam obstruções recorrentes. O lançamento inadequado de absorventes, preservativos ou hastes flexíveis nos vasos sanitários gera bloqueios nos ramais e prumadas. No campo elétrico, o uso de equipamentos acima da capacidade do quadro da unidade pode causar curtos-circuitos, quedas de energia no edifício inteiro e até incêndios. São exemplos cotidianos que, embora pareçam pontuais, afetam diretamente o coletivo.

Durante obras e reformas, a NBR 16.280 estabelece responsabilidades técnicas claras e exige acompanhamento especializado. Entretanto, na fase de uso das unidades, abre-se um verdadeiro limbo de gestão. Nesse período, o morador raramente verifica seus disjuntores, observa sinais de superaquecimento em tomadas, testa a vazão dos ralos, inspeciona a tubulação de gás ou avalia o funcionamento do aquecedor. Em vez de ações preventivas, prevalece a postura reativa: só se procura ajuda quando o problema já se manifesta. Pior, muitas vezes opta-se por soluções improvisadas, realizadas por profissionais sem qualificação, que apenas mascaram os danos sem pensar na longevidade dos sistemas.

Nos empreendimentos de padrão mais elevado, o cenário pode ser ainda mais crítico. O número maior de equipamentos, como sistemas de ar-condicionado, automações, aquecedores a gás e máquinas de alta potência, amplia a complexidade operacional. Embora exista maior presença de profissionais qualificados, a falta de rotinas estruturadas de manutenção continua sendo um ponto vulnerável. Sem uma cultura preventiva, mesmo os sistemas mais modernos estão sujeitos a falhas graves.

As estatísticas reforçam a gravidade do tema. Em 2023, o Corpo de Bombeiros do Ceará registrou 149 incêndios em edificações multifamiliares. A Sabesp alerta que apenas um litro de óleo pode contaminar até 25 mil litros de água, o que dá a dimensão do impacto quando esse resíduo é descartado em tubulações prediais de pequeno diâmetro. Um levantamento da SulAmérica Seguros revelou que, entre 2014 e 2017, 48% dos sinistros em condomínios estiveram relacionados a danos elétricos. Esses números demonstram que os hábitos cotidianos, quando incorretos, se transformam em riscos coletivos reais.

Diante desse quadro, a inspeção predial e a gestão de manutenção tornam-se instrumentos estratégicos. Mesmo sem acesso direto às unidades autônomas, elas são capazes de identificar sinais indiretos do mau uso, como entupimentos recorrentes, quedas de energia e falhas em prumadas. A inspeção atua como um radar, detectando anomalias que comprometem o desempenho da edificação. Já a gestão de manutenção transforma esses achados em planos estruturados, definindo o que deve ser feito, com que frequência e quais recursos utilizar, sempre com foco em prolongar a vida útil dos sistemas. Além disso, relatórios e campanhas educativas derivados desse trabalho funcionam como ferramentas de conscientização dos moradores, fortalecendo a cultura da prevenção.

Mais do que a idade da edificação, o método construtivo ou o padrão do empreendimento, o que determina a saúde de um condomínio é a existência de um plano de manutenção bem elaborado, desenvolvido sob medida para o edifício. Pequenas ações individuais podem gerar grandes problemas, mas a gestão preventiva é a chave para preservar a segurança, o patrimônio e o bom convívio coletivo.